"Escrevo-te a ti, que andas por aí à minha procura, numa solidão povoada, vazia e acomodada à espera que a vida te ponha no caminho uma mulher como eu. Não sei como te chamas nem por que inicial o teu nome começa, mas sei que existes, que me esperas e desejas e que um dia farás parte da minha vida.
Vejo-te em sonhos, és alto, só podes ser alto, tímido e discreto, sorriso franco e olhar directo. As mãos pequenas, o cabelo forte e ondulado, a cara certa, regular, a boca perfeita e um nariz angular... andas depressa e no entanto és calmo, trabalhas muito e vives com paixão aquilo que fazes, vais longe, muito longe, provavelmente mais longe do que tu próprio imaginas porque, como todos os homens inteligentes pões em causa as tuas capacidades. Mas isso só serve para ponderares sempre mais e melhor os teus futuros passos até chegares onde queres. A tua sensibilidade é o teu melhor guia, mas às vezes desconfias dos teus sentidos, reflectes e voltas atrás, esperas e repensas, equacionas e desenhas outros cenários, sem pressa e com todo o cuidado. Não és um estratega nem um jogador, tal como eu és apenas um sonhador e quando a alma sonha projecta e acontece, as coisas saem-nos bem e por isso sabes que um dia, quando te cruzares no meu caminho e reconheceres as minhas mãos frágeis e esguias como as tuas aquelas com que vais adormecer todas as noites até ao fim da tua vida, quando vires nos meus olhos a cor e a luz que não mais te deixarão, saberás que me encontraste, que o nosso amor, agora ainda uma semente por germinar, poderá ser lançado à terra por uma mão certeira e experiente, que o tempo e o clima se encarregarão de proteger...
Imagino-te a meu lado, todos os dias e todas as noites e todos os dias outra vez, vejo-te acordar de manhã despenteado, levantas-te e vais à cozinha fazer-me sumo de laranja, espalhas a geleia em fatias de pão, escreves-me três linhas que dizem tudo num guardanapo de papel e acordas-me para a vida. eu pouso o tabuleiro no colo e depois trazes leite com Ovomaltine que beberemos juntos da mesma caneca e assim começamos mais um dia cheio de beijos e afectos partilhados.
Conversamos muito, tu e eu, cada um no seu canto, neste prelúdio do nosso encontro. Nunca ouvi a tua voz mas sei que reconhecerei a sua doçura no primeiro acorde e quando falarmos saberei que nos entenderemos quase sempre, que quando eu começar uma frase tu a conseguirás acabar, que tudo ouvirei mesmo quando nada disseres e que guardaremos o melhor de tudo todos os dias um bocadinho, como pedaços de uma corda que atados uns aos outros vão construir uma escada...
E então começaremos a subi-la juntos, sempre juntos e quando olharmos para trás e virmos que já subimos muito, vamos ter medo mas nem vamos pensar em voltar para trás, porque esperámos demais os dois por isto. A solidão voluntária foi a travessia no deserto adequado e se demorou o que demorou é porque não mais se repetirá... e essa força e vontade de fazer tudo certo vai-nos empurrar até lá cima, onde tudo é tão perfeito que ninguém pode tocar, onde não há medo e só a vontade comanda e a paixão apaziguada pela espera vai então estoirar como um vulcão...
Mas até lá, prefiro não te ver, não te ouvir, não te falar e apenas sorrir, olhar-te nos olhos e ver se já lá estou, se já lá estava, se sempre estive dentro de ti. E se assim for, conta comigo para a vida. Não para hoje, nem para amanhã, mas para sempre, sempre e para sempre como a mulher que escolheste para o teu lado.
E então a tua inicial será a primeira e a última, a única e derradeira, aquela que existe para estar ao lado da minha."
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O teu raio de sol...