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segunda-feira, junho 15

Mergulhos (d)na vida

imagem MB
(Ainda sobre o fim de semana alargado da M. no Alentejo e tornando óbvio que lá dei um pulo, para aproveitar o sol e as bochechas com sabor a cloro, da minha filha)
Encetada que estava uma grande amizade, como sempre são as grandes amizades quando somos crianças- sendo que o facto de poder durar apenas um dia é absolutamente irrelevante para a vida- a M. e outra miúda, que pela estatura e discurso deveria rondar os 12 anos, iam partilhando detalhes das suas vidas - a da outra bem mais a norte, percebi - entre mergulhos e piscinas. A dada altura, chegou aquele incontornável momento de fazer as habilidades que desde pequenos aprendemos a fazer para impressionar os outros, e que depois continuamos pela vida fora, adequando apenas a sofisticação dos métodos aos resultados pretendidos.
Assim sendo, eis senão quando a M. foi surpreendida pelas duas cambalhotas que a outra conseguia dar debaixo de água, habilidade a que assistia com disfarçado constrangimento, enquanto nos seus olhos se percebia conversar com as alças do biquíni como adoraria reproduzir tamanho feito.
Acabada a demonstração, a outra miúda perguntava à M. por que razão ainda mergulhava com o dedo no nariz, tendo tido a pronta resposta de que era assim porque lhe dava mais jeito, mas que também sabia mergulhar sem tal acessório. Ora, posto isto, havia naturalmente que demonstrar a veracidade do que acabava de dizer, tendo a M. decidido heroicamente mergulhar sem a sua estimada obstrução nasal, versão digital.
Vindo ao cimo, fazia aquelas caretas que bem lhe conheço e que melhor ainda compreendo- porque aqui a Je já tem estatuto de idade que lhe permita dizer, sem um pingo de vergonha na cara, que faz exactamente o mesmo.
Olhou-me, entre o orgulhosa pela proeza e o desgostosa pela sensação e eu, coração de mãe cúmplice de narizes que metem água, sorri-lhe, piscando-lhe ligeiramente o olho.
Enquanto mãe, e sobretudo enquanto mãe no papel de educadora, questiono-me muitas vezes se devemos sempre incentivar os nossos filhos a ultrapassar as barreiras dos seus limites. É que se é verdade que a convivência com as realidades e competências dos outros pode ser muitíssimo estimulante e enriquecedora, ajudando-nos tantas vezes a descobrir capacidades que desconhecíamos e a desenvolver outras adormecidas, querendo ir mais além, é também verdade que a relação mais equilibrada com a vida me parece passar por assumirmos que há coisas que mesmo que consigamos não desejamos fazer e outras ainda que nunca conseguiremos fazer, ou porque não estão ao alcance das nossas capacidades ou porque não fazem parte dos nossos ideais de vida.
Neste caso, um mergulho de dedo no nariz ou sem dedo no nariz pode deixar de ser apenas isso. Pode passar a ser a necessidade de corresponder às expectativas de outrem, de não ficar atrás, de mostrar, mais do que a nós aos outros, que conseguimos fazer o que a maioria faz, aparentemente de forma natural.
Na ambiguidade do meu papel de mãe, desejo que a M. deseje mergulhar sem dedo no nariz, mas não que se sinta obrigada a fazê-lo só porque isso é o esperado. Porque de si espero o melhor, pois claro, mas apenas o melhor que está ao seu alcance dar. Não o melhor que outros decidem por si.
E, sejamos honestos, quantas vezes no nosso dia a dia damos mergulhos, de dedo no nariz?

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